Porque é urgente implantar o Registro Digital de Cada Voto (RDCV) no novo Código Eleitoral
O RDCV deve incluir uma assinatura eletronica qualificada feita com um certificado digital ICP-Brasil individual instalado em cada urna eletrônica
O sistema eletrônico de votação no Brasil é reconhecido por sua eficiência, mas precisa evoluir para cumprir as leis atuais e garantir publicidade, segurança, transparência e confiança. Este artigo explica, de forma simples, por que o Registro Digital do Voto (RDV)1, usado nas urnas eletrônicas, não atende às exigências legais e por que o Registro Digital de Cada Voto (RDCV), assinado com um certificado digital da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil)2, é a solução necessária.
O que é o Registro Digital do Voto (RDV)?
O RDV é um arquivo digital gerado pelas urnas eletrônicas que armazena todos os votos de uma eleição, misturados em um único documento. Ele é assinado eletronicamente com certificados emitidos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), mas fora do sistema da ICP-Brasil, que é o padrão oficial do Brasil para documentos eletrônicos. Além disso, o RDV é alterado a cada voto e só é assinado após o término da votação. Não existe, portanto, um registro digital de cada voto, como estabelece a Lei Eleitoral3.
Por que o RDV atual é um problema?
As leis brasileiras, como a Lei nº 14.063/20204 e a Medida Provisória nº 2.200-2/20015, exigem que documentos eletrônicos oficiais, como os registros de voto, usem assinaturas eletrônicas qualificadas, feitas com certificados digitais da ICP-Brasil. Esses certificados garantem que o documento é autêntico, não foi alterado e tem valor legal, como uma assinatura escrita à mão.
O RDV, porém, usa um formato que não é reconhecido pela ICP-Brasil, e é assinado com certificados emitidos pelo TSE6, que não têm validade jurídica para atos oficiais. Isso significa que os registros de voto atuais podem ser questionados legalmente, já que não seguem as normas exigidas. Além disso, o Tribunal de Contas da União (TCU), em 2021, apontou fragilidades no sistema eleitoral, como riscos de manipulação de dados e dificuldades de auditoria7, que poderiam ser resolvidos com uma solução que atende às leis.
O que é o RDCV e como ele resolve esses problemas?
O Registro Digital de Cada Voto (RDCV) é uma proposta para substituir o RDV. Ele registra cada voto em um documento eletrônico individual, assinado com um certificado digital ICP-Brasil instalado em cada urna. Os benefícios incluem:
Conformidade com a lei: Atende às exigências da Lei nº 14.063/2020, garantindo validade jurídica aos registros de voto.
Publicidade: Permite que o eleitor possa verificar o registro do seu voto, assegurando, no processo eleitoral, a publicidade exigida pelo Art. 37 da Constituição Federal8.
Transparência: Permite que peritos independentes verifiquem os registros, respeitando o sigilo do eleitor, conforme exigido pela Constituição.
Segurança: Cada voto é protegido por uma assinatura digital verificável por ferramentas públicas, como as fornecidas pelo Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI).
Padrões internacionais: Organizações especializadas, como o International IDEA, o MIT Elections Data Sciense Lab e o The Election Integrity Project, recomendam sistemas que permitam a verificação pelo eleitor, rastreabilidade e auditoria, como o RDCV.
Por exemplo, imagine cada urna como um cartório digital: ao registrar um voto, ela "carimba" o arquivo com um selo oficial da ICP-Brasil, garantindo que ele é verdadeiro e não foi alterado. Isso facilita auditorias e aumenta a confiança no processo.
Por que certificados fora da ICP-Brasil são ilegais?
O Parecer nº 00378/2019/PROFE/PFE-ITI/PGF/9, da Advocacia-Geral da União (AGU), esclarece que Administração Pública não pode emitir certificados digitais fora da ICP-Brasil e que esta atividade é ilegal. A Lei nº 14.063/202 reforça que apenas assinaturas eletrônicas qualificadas, baseadas na ICP-Brasil, são aceitas para documentos que exigem alta confiabilidade, como o registro digital de cada voto. Outros tipos de assinaturas (simples ou avançadas) podem ser usados em cadastros ou consultas, mas não em eleições.
O que o novo Código Eleitoral pode fazer?
O novo Código Eleitoral, em discussão no Congresso, é uma oportunidade para corrigir esses problemas. Ele pode incluir um artigo exigindo que cada urna eletrônica use o RDCV com certificados ICP-Brasil, garantindo que os votos sejam registrados de forma segura, legal e auditável. Isso alinharia o Brasil às melhores práticas internacionais e responderia às preocupações do TCU sobre a segurança do sistema eleitoral.
Conclusão
O atual RDV, usado nas urnas eletrônicas, não atende às leis brasileiras, não assegura a publicidade exigida pela Constituição e apresenta riscos à segurança e à integridade das eleições. A adoção do RDCV com certificados ICP-Brasil é uma solução prática e legal para garantir que cada voto seja registrado com autenticidade, integridade e presunção legal de veracidade. Esta mudança fortalece a democracia, aumenta a confiança da população e alinha o Brasil aos padrões globais de eleições seguras.
Anexo Técnico-Jurídico: Detalhamento sobre o RDCV e a Conformidade com a ICP-Brasil
1. Base Legal e Normativa
A obrigatoriedade de certificados digitais da ICP-Brasil para atos da Administração Pública é fundamentada na Medida Provisória nº 2.200-2/2001, que institui a ICP-Brasil como o sistema oficial para garantir autenticidade, integridade e validade jurídica de documentos eletrônicos. A Lei nº 14.063/2020 complementa essa norma, definindo três tipos de assinaturas eletrônicas:
Simples: Para interações de baixa criticidade, como cadastros (art. 4º, inciso I).
Avançada: Vinculada ao signatário, mas sem exigência de certificado ICP-Brasil (art. 4º, inciso II).
Qualificada: Baseada em certificados ICP-Brasil, obrigatória para atos que exigem presunção de validade jurídica, como registros eleitorais (art. 4º, inciso III).
A Lei nº 9.504/1997 (art. 59, §4º, alterado pela Lei nº 10.740/2003) determina que as urnas eletrônicas devem registrar cada voto com assinatura digital, garantindo anonimato e identificação da urna. Com a Lei nº 14.063/2020, a "assinatura digital" é interpretada como assinatura eletrônica qualificada, exigindo certificados ICP-Brasil.
2. Incompatibilidade do RDV com a ICP-Brasil
O Registro Digital do Voto (RDV), gerado pelas urnas eletrônicas, é assinado em formato binário ASN.1 com certificados digitais emitidos internamente pelo TSE, fora da ICP-Brasil. Contudo, o DOC-ICP-15.01 do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI) estabelece que assinaturas eletrônicas qualificadas devem:
Utilizar certificados digitais válidos da ICP-Brasil.
Estar em formatos padronizados (CAdES, XAdES ou PAdES).
Ser verificáveis por ferramentas públicas e interoperáveis.
O formato ASN.1 não está entre os padrões reconhecidos, e os certificados da urna eletrônica, emitidos fora da ICP-Brasil, não conferem presunção de validade jurídica, conforme o Parecer 00378/2019/PROFE/PFE-ITI/PGF/AGU de 2019. Esse parecer conclui que certificados fora da ICP-Brasil são ilegais para atos oficiais, devido a riscos de insegurança jurídica e falta de interoperabilidade.
3. Fragilidades do Sistema Atual
O Acórdão nº 2522/2021 do Tribunal de Contas da União (TCU) aponta vulnerabilidades no sistema eleitoral, incluindo:
Baixa governança no desenvolvimento e manutenção de sistemas.
Fragilidades na auditabilidade, dificultando a verificação independente.
Riscos de quebra de sigilo do voto e manipulação de dados.
Possibilidade de acesso indevido ou vazamento de informações.
Esses problemas poderiam ser mitigados com a adoção do RDCV, que utiliza certificados ICP-Brasil e formatos padronizados, permitindo auditoria por peritos independentes.
4. Benefícios do RDCV
O Registro Digital de Cada Voto (RDCV) propõe que cada urna eletrônica registre os votos com uma assinatura eletrônica qualificada, usando um certificado digital individual emitido pela ICP-Brasil. Os benefícios incluem:
Conformidade legal: Atende à Lei nº 14.063/2020 e à MP nº 2.200-2/2001.
Auditabilidade: Permite verificação por ferramentas públicas, como o Verificador de Assinaturas do ITI.
Interoperabilidade: Usa formatos (CAdES, XAdES, PAdES) compatíveis com sistemas nacionais e internacionais.
Segurança: Garante autenticidade e integridade, preservando o anonimato do eleitor.
Alinhamento internacional: Segue recomendações de organizações como o International IDEA (2020, Adoption of Voting Technology, seção 3.2) e o MIT Election Data and Science Lab para rastreabilidade e publicidade.
5. Proposta para o Código Eleitoral
O novo Código Eleitoral deve atualizar o art. 59, §4º, da Lei nº 9.504/1997, para exigir o RDCV com certificados ICP-Brasil. Sugestão de redação:
Art. 59, §4º: A urna eletrônica deve registrar digitalmente cada voto em um documento eletrônico com assinatura eletrônica qualificada, conforme padrões da ICP-Brasil, garantindo autenticidade, integridade, anonimato do eleitor, presunção legal de veracidade e auditabilidade por ferramentas públicas, em conformidade com a Lei nº 14.063/2020.
6. Comparação RDV vs. RDCV
O Registro Digital do Voto (RDV), atualmente utilizado nas urnas eletrônicas, apresenta limitações críticas em relação ao Registro Digital de Cada Voto (RDCV) proposto. O RDV utiliza certificados digitais emitidos pela Autoridade Certificadora Urnas (AC Urnas), que opera fora da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil), e é estruturado em formato binário ASN.1, não reconhecido pelos padrões da ICP-Brasil. Conforme o Parecer nº 00378/2019/PROFE/PFE-ITI/PGF/AGU de 2019, da Procuradoria Federal Especializada junto ao Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI), a emissão de certificados fora da ICP-Brasil é ilegal para atos da Administração Pública que exigem validade jurídica plena, como os registros eleitorais. Esse parecer, fundamentado na Medida Provisória nº 2.200-2/2001, destaca que apenas certificados ICP-Brasil conferem presunção de autenticidade e integridade a documentos eletrônicos oficiais. Assim, o RDV não possui validade jurídica garantida e tem auditabilidade limitada, dependendo exclusivamente de ferramentas controladas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Em contraste, o RDCV propõe que cada urna eletrônica registre os votos com assinaturas eletrônicas qualificadas, utilizando certificados digitais emitidos pela ICP-Brasil. Esses certificados, instalados individualmente em cada urna, geram assinaturas nos formatos padronizados CAdES, XAdES ou PAdES, conforme exigido pelo DOC-ICP-15.0110 do ITI e pela Lei nº 14.063/202011. O RDCV assegura validade jurídica plena, permitindo que os registros sejam verificados por ferramentas públicas e interoperáveis, facilitando auditorias por peritos independentes. Além disso, atende às normas nacionais e às recomendações internacionais de integridade eleitoral, como as do International IDEA12 e do MIT Election Data and Science Lab13, promovendo maior segurança, transparência e confiança no processo eleitoral.
7. Conclusão Técnica
A substituição do RDV pelo RDCV é essencial para alinhar o processo eleitoral às normas da ICP-Brasil, garantindo validade jurídica, publicidade e segurança. O uso de certificados fora da ICP-Brasil, como os da AC Urnas, é ilegal para atos oficiais, conforme o Parecer nº 00378/2019/PROFE/PFE-ITI/PGF/AGU14. O RDCV atende às exigências legais, responde às preocupações do TCU e alinha o Brasil aos padrões internacionais de integridade eleitoral.
Excelente artigo! Só uma dúvida: a sigla para “Registro Digital De Cada Voto” não seria RDCV ao invés de RCDV?
Muito bom artigo. Esperemos que seja implantada a solução proposta!