Porque é urgente implantar o Registro Digital de Cada Voto (RCDV) no novo Código Eleitoral
O RCDV deve incluir uma assinatura eletronica qualificada feita com um certificado digital ICP-Brasil individual instalado em cada urna eletrônica
O sistema eletrônico de votação no Brasil é reconhecido por sua eficiência, mas precisa evoluir para cumprir as leis atuais e garantir publicidade, segurança, transparência e confiança. Este artigo explica, de forma simples, por que o Registro Digital do Voto (RDV), usado nas urnas eletrônicas, não atende às exigências legais e por que o Registro Digital de Cada Voto (RCDV), assinado com um certificado digital da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil), é a solução necessária.
O que é o Registro Digital do Voto (RDV)?
O RDV é um arquivo digital gerado pelas urnas eletrônicas que armazena todos os votos de uma eleição, misturados em um único documento. Ele é assinado eletronicamente com certificados emitidos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), mas fora do sistema da ICP-Brasil, que é o padrão oficial do Brasil para documentos eletrônicos. Além disso, o RDV é alterado a cada voto e só é assinado após o término da votação. Não existe, portanto, um registro digital de cada voto, como estabelece a Lei Eleitoral [1].
Por que o RDV atual é um problema?
As leis brasileiras, como a Lei nº 14.063/2020[2] e a Medida Provisória nº 2.200-2/2001[3], exigem que documentos eletrônicos oficiais, como os registros de voto, usem assinaturas eletrônicas qualificadas, feitas com certificados digitais da ICP-Brasil. Esses certificados garantem que o documento é autêntico, não foi alterado e tem valor legal, como uma assinatura escrita à mão.
O RDV, porém, usa um formato que não é reconhecido pela ICP-Brasil, e é assinado com certificados emitidos pelo TSE[9], que não têm validade jurídica para atos oficiais. Isso significa que os registros de voto atuais podem ser questionados legalmente, já que não seguem as normas exigidas. Além disso, o Tribunal de Contas da União (TCU), em 2021, apontou fragilidades no sistema eleitoral, como riscos de manipulação de dados e dificuldades de auditoria[6], que poderiam ser resolvidos com uma solução que atende às leis.
O que é o RCDV e como ele resolve esses problemas?
O Registro Digital de Cada Voto (RCDV) é uma proposta para substituir o RDV. Ele registra cada voto em um documento eletrônico individual, assinado com um certificado digital ICP-Brasil instalado em cada urna. Os benefícios incluem:
Conformidade com a lei: Atende às exigências da Lei nº 14.063/2020, garantindo validade jurídica aos registros de voto.
Publicidade: Permite que o eleitor possa verificar o registro do seu voto, assegurando, no processo eleitoral, a publicidade exigida pela Constituição.
Transparência: Permite que peritos independentes verifiquem os registros, respeitando o sigilo do eleitor, conforme exigido pela Constituição.
Segurança: Cada voto é protegido por uma assinatura digital verificável por ferramentas públicas, como as fornecidas pelo Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI).
Padrões internacionais: Organizações especializadas, como o International IDEA[7], o MIT Elections Data Sciense Lab[8] e o The Election Integrity Project, recomendam sistemas que permitam a verificação pelo eleitor, rastreabilidade e auditoria, como o RCDV.
Por exemplo, imagine cada urna como um cartório digital: ao registrar um voto, ela "carimba" o arquivo com um selo oficial da ICP-Brasil, garantindo que ele é verdadeiro e não foi alterado. Isso facilita auditorias e aumenta a confiança no processo.
Por que certificados fora da ICP-Brasil são ilegais?
O Parecer nº 00378/2019/PROFE/PFE-ITI/PGF/[5], da Advocacia-Geral da União (AGU), esclarece que Administração Pública não pode emitir certificados digitais fora da ICP-Brasil e que esta atividade é ilegal. A Lei nº 14.063/2020[2] reforça que apenas assinaturas eletrônicas qualificadas, baseadas na ICP-Brasil, são aceitas para documentos que exigem alta confiabilidade, como o registro digital de cada voto. Outros tipos de assinaturas (simples ou avançadas) podem ser usados em cadastros ou consultas, mas não em eleições.
O que o novo Código Eleitoral pode fazer?
O novo Código Eleitoral, em discussão no Congresso, é uma oportunidade para corrigir esses problemas. Ele pode incluir um artigo exigindo que cada urna eletrônica use o RCDV com certificados ICP-Brasil, garantindo que os votos sejam registrados de forma segura, legal e auditável. Isso alinharia o Brasil às melhores práticas internacionais e responderia às preocupações do TCU sobre a segurança do sistema eleitoral.
Conclusão
O atual RDV, usado nas urnas eletrônicas, não atende às leis brasileiras, não assegura a publicidade exigida pela Constituição e apresenta riscos à segurança e à integridade das eleições. A adoção do RCDV com certificados ICP-Brasil é uma solução prática e legal para garantir que cada voto seja registrado com autenticidade, integridade e presunção legal de veracidade. Esta mudança fortalece a democracia, aumenta a confiança da população e alinha o Brasil aos padrões globais de eleições seguras.
Anexo Técnico-Jurídico: Detalhamento sobre o RCDV e a Conformidade com a ICP-Brasil
1. Base Legal e Normativa
A obrigatoriedade de certificados digitais da ICP-Brasil para atos da Administração Pública é fundamentada na Medida Provisória nº 2.200-2/2001[3], que institui a ICP-Brasil como o sistema oficial para garantir autenticidade, integridade e validade jurídica de documentos eletrônicos. A Lei nº 14.063/2020[2] complementa essa norma, definindo três tipos de assinaturas eletrônicas:
Simples: Para interações de baixa criticidade, como cadastros (art. 4º, inciso I).
Avançada: Vinculada ao signatário, mas sem exigência de certificado ICP-Brasil (art. 4º, inciso II).
Qualificada: Baseada em certificados ICP-Brasil, obrigatória para atos que exigem presunção de validade jurídica, como registros eleitorais (art. 4º, inciso III).
A Lei nº 9.504/1997[1] (art. 59, §4º, alterado pela Lei nº 10.740/2003) determina que as urnas eletrônicas devem registrar cada voto com assinatura digital, garantindo anonimato e identificação da urna. Com a Lei nº 14.063/2020[2], a "assinatura digital" é interpretada como assinatura eletrônica qualificada, exigindo certificados ICP-Brasil.
2. Incompatibilidade do RDV com a ICP-Brasil
O Registro Digital do Voto (RDV), gerado pelas urnas eletrônicas, é assinado em formato binário ASN.1 com certificados digitais emitidos internamente pelo TSE[9], fora da ICP-Brasil. Contudo, o DOC-ICP-15.01[4] do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI) estabelece que assinaturas eletrônicas qualificadas devem:
Utilizar certificados digitais válidos da ICP-Brasil.
Estar em formatos padronizados (CAdES, XAdES ou PAdES).
Ser verificáveis por ferramentas públicas e interoperáveis.
O formato ASN.1 não está entre os padrões reconhecidos, e os certificados da urna eletrônica, emitidos fora da ICP-Brasil, não conferem presunção de validade jurídica, conforme o Parecer 00378/2019/PROFE/PFE-ITI/PGF/AGU[5] de 2019. Esse parecer conclui que certificados fora da ICP-Brasil são ilegais para atos oficiais, devido a riscos de insegurança jurídica e falta de interoperabilidade.
3. Fragilidades do Sistema Atual
O Acórdão nº 2522/2021 do Tribunal de Contas da União (TCU)[6] aponta vulnerabilidades no sistema eleitoral, incluindo:
Baixa governança no desenvolvimento e manutenção de sistemas.
Fragilidades na auditabilidade, dificultando a verificação independente.
Riscos de quebra de sigilo do voto e manipulação de dados.
Possibilidade de acesso indevido ou vazamento de informações.
Esses problemas poderiam ser mitigados com a adoção do RCDV, que utiliza certificados ICP-Brasil e formatos padronizados, permitindo auditoria por peritos independentes.
4. Benefícios do RCDV
O Registro Digital de Cada Voto (RCDV) propõe que cada urna eletrônica registre os votos com uma assinatura eletrônica qualificada, usando um certificado digital individual emitido pela ICP-Brasil. Os benefícios incluem:
Conformidade legal: Atende à Lei nº 14.063/2020[2] e à MP nº 2.200-2/2001.
Auditabilidade: Permite verificação por ferramentas públicas, como o Verificador de Assinaturas do ITI.
Interoperabilidade: Usa formatos (CAdES, XAdES, PAdES) compatíveis com sistemas nacionais e internacionais.
Segurança: Garante autenticidade e integridade, preservando o anonimato do eleitor.
Alinhamento internacional: Segue recomendações de organizações como o International IDEA (2020, Adoption of Voting Technology, seção 3.2)[7] e o MIT Election Data and Science Lab[8] para rastreabilidade e publicidade.
5. Proposta para o Código Eleitoral
O novo Código Eleitoral deve atualizar o art. 59, §4º, da Lei nº 9.504/1997[1], para exigir o RCDV com certificados ICP-Brasil. Sugestão de redação:
Art. 59, §4º: A urna eletrônica deve registrar digitalmente cada voto em um documento eletrônico com assinatura eletrônica qualificada, conforme padrões da ICP-Brasil, garantindo autenticidade, integridade, anonimato do eleitor, presunção legal de veracidade e auditabilidade por ferramentas públicas, em conformidade com a Lei nº 14.063/2020.
6. Comparação RDV vs. RCDV
O Registro Digital do Voto (RDV), atualmente utilizado nas urnas eletrônicas, apresenta limitações críticas em relação ao Registro Digital de Cada Voto (RCDV) proposto. O RDV utiliza certificados digitais emitidos pela Autoridade Certificadora Urnas (AC Urnas), que opera fora da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil), e é estruturado em formato binário ASN.1, não reconhecido pelos padrões da ICP-Brasil. Conforme o Parecer nº 00378/2019/PROFE/PFE-ITI/PGF/AGU[5] de 2019, da Procuradoria Federal Especializada junto ao Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI), a emissão de certificados fora da ICP-Brasil é ilegal para atos da Administração Pública que exigem validade jurídica plena, como os registros eleitorais. Esse parecer, fundamentado na Medida Provisória nº 2.200-2/2001[3], destaca que apenas certificados ICP-Brasil conferem presunção de autenticidade e integridade a documentos eletrônicos oficiais. Assim, o RDV não possui validade jurídica garantida e tem auditabilidade limitada, dependendo exclusivamente de ferramentas controladas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Em contraste, o RCDV propõe que cada urna eletrônica registre os votos com assinaturas eletrônicas qualificadas, utilizando certificados digitais emitidos pela ICP-Brasil. Esses certificados, instalados individualmente em cada urna, geram assinaturas nos formatos padronizados CAdES, XAdES ou PAdES, conforme exigido pelo DOC-ICP-15.01[4] do ITI e pela Lei nº 14.063/2020[2]. O RCDV assegura validade jurídica plena, permitindo que os registros sejam verificados por ferramentas públicas e interoperáveis, facilitando auditorias por peritos independentes. Além disso, atende às normas nacionais e às recomendações internacionais de integridade eleitoral, como as do International IDEA[7] e do MIT Election Data and Science Lab[8], promovendo maior segurança, transparência e confiança no processo eleitoral.
7. Conclusão Técnica
A substituição do RDV pelo RCDV é essencial para alinhar o processo eleitoral às normas da ICP-Brasil, garantindo validade jurídica, publicidade e segurança. O uso de certificados fora da ICP-Brasil, como os da AC Urnas, é ilegal para atos oficiais, conforme o Parecer nº 00378/2019/PROFE/PFE-ITI/PGF/AGU[5]. O RCDV atende às exigências legais, responde às preocupações do TCU e alinha o Brasil aos padrões internacionais de integridade eleitoral.
Referências
[1] Lei nº 9.504/1997 (art. 59, §4º)
[2] Lei nº 14.063/2020
[3] Medida Provisória nº 2.200-2/2001
[4] ICP-Brasil: DOC-ICP-15 Versão 1.0
[5] Parecer PF-ITI/AGU nº 20/2014
[6] Acórdão nº 2522/2021 – Plenário do TCU
[7] International IDEA - “Adoption of Voting Technology: A Guide for Electoral Stakeholders in Indonesia”
[8] MIT Election Data and Science Lab, Election Security Standards, 2021
[9] TSE – Documentação técnica do software da urna eletrônica – Eleições 2022
Muito bom artigo. Esperemos que seja implantada a solução proposta!
Excelente artigo! Só uma dúvida: a sigla para “Registro Digital De Cada Voto” não seria RDCV ao invés de RCDV?